quinta-feira, 9 de junho de 2011

Livro | As Crônicas Saxônicas

Por: Nicholas Moreira

Aye!

Hoje vamos falar sobre a série de livros As Crônicas Saxônicas, escrita pelo inglês Bernard Cornwell, o George Lucas da ficção-histórica dos nossos tempos.


A história de Crônicas se passa durante as invasões vikings à Grâ-Bretanha no século IX, e narra as aventuras de Uhtred (ou Utred, Ootred, Ultred...) de Bebbanburg, antiga fortaleza da Nortúmbria. Guerreiro fenomenal, estrategista brilhante e herói relutante, Uhtred segue à frente dos Saxões, empunhando uma espada sangrenta na mão direita e um amuleto enferrujado a Thor na outra, batendo de frente com o estabilishment cristão da época, e eternamente dividido entre a lealdade forçada à Inglaterra de Alfredo, rei de Wessex, e a admiração aos invasores dinamarqueses e seus ídolos pagãos, que ele venera e respeita.

No primeiro livro (O Último Reino, de 2004), o jovem e aristocrático Uhtred é capturado pelos dinamarqueses, escravizado e, entre um e outro cascudo, acaba sendo educado no viking way. É nesse meio que o nosso jovem e destemido herói desenvolve sua habilidade com a espada e o orgulho guerreiro que o tornarão famoso e temido em toda a Inglaterra (ok, não existe Inglaterra ainda; mas espere só!). No segundo livro (O Cavaleiro da Morte, de 2005) Uhtred está envolvido até o pescoço na resistência aos invasores vikings, e no terceiro (Os Senhores do Norte, de 2006) nosso herói volta para o norte gelado em busca de recuperar seu título de nobreza, tomar sua terra natal e esmagar alguns crânios pelo caminho.

A série conta atualmente com cinco livros, sendo que o sexto volume está quase concluído. Cornwell diz que não sabe exatamente quantos volumes ainda serão necessários para que as aventuras de Uhtred cheguem ao fim, mas arrisca: "Mais de quatro e menos que doze", diz o matreiro escritor.

Crônicas empolga desde o primeiro capítulo, perdendo um pouco o fôlego apenas a partir do quarto volume. Não existem as firulas e sutilezas que se esperaria de um verdadeiro épico medieval, porém descrições apuradas e bem-pesquisadas da geografia inglesa permeiam todo o texto, colorindo com a rapidez de um desenhista de bordel as paisagens frias e lamacentas da Saxônia de 1000 anos atrás, e atribuindo uma humanidade desconcertante aos personagens mais importantes dos reinos de Alfredo, o Grande. As cenas de ação são violentas e tecnicamente exatas, ganhando tons impressionantes sob a pena sangrenta de Cornwell. Some a isto tramas emocionantes e bem romanceadas, personagens carismáticos e superficiais, e... voilá! eis que surge um verdadeiro clássico da literatura-pipoca, ambientado numa época em que o valor de um homem era medido pela força de seu braço ou pela sua capacidade de embromar vestindo uma batina.

Cotação: 3 espadadas na cabeça. Com louvor!

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Filme | Nosso Lar

Olá, pessoal!

É com grande prazer que inicio minha passagem por este blog. Fui colunista do jornal o Globo durante a queda da Ditadura Militar, trabalhei na revista Veja durante a queda do Muro de Berlim e trabalhei com Guttemberg na cobertura da queda da Bastilha (brinks!). Enfim, me sinto em casa.


Por: Nicholas Moreira

Hoje, vamos falar do filme Nosso Lar, um dos maiores fenômenos cinematográficos já vistos em terras tupiniquins. Não apenas por ter sido assistido por millhões de pessoas, mas também por ser mostra inequívoca da força que vem demonstrando a sétima arte com fins metafísicos. Nada a ver com a nossa incapacidade como povo em trabalhar temas científicos, claro. 


O filme começa com André Luiz (narrador) acordando com a cara enfiada na lama do Umbral, se perguntando porque diabos estaria ali se havia sido um sujeito tão legal enquanto vivo. Nesse interim, o distinto ex-médico tem flashbacks de várias situações enquanto encarnado que tentam ajudar o espectador a compreender um pouco mais da natureza psicológica do personagem e dos tormentos que se desenrolam ali. Após muito tempo comendo o capim que o diabo amassou (literalmente), André dirige seus pensamentos a Deus, pede ajuda e é resgatado por uma equipe de socorristas que o transportam para a colônia espiritual de Nosso Lar. A partir daí o filme alterna várias descobertas metafísicas à lições morais acerca da Lei de Ação e Reação, à qual todos estão submetidos segundo os princípios esposados pelo Espiritismo.

Tecnicamente falando, o filme possui produção primorosa e direção de arte excelente, fatores raras vezes vistos em filmes nacionais com temática religiosa. Quase todos os cenários na cidade espiritual são compostos por cenas de CGI, a maioria muito bem trabalhadas e integradas de forma muito natural com os atores. O figurino, que facilmente poderia desandar e transformar os personagens em clichês ambulantes, foi muito bem pensado, e a riqueza dos cenários do início do século XX, apesar de poucos, constrastam muito fortemente com os cenários rudimentares e escuros de Bezerra de Menezes, outra produção espírita contemporânea, mostrando que não foram poupados recursos para transformar uma das obras primas de Francisco Cândido Xavier em película.

Porém, nem tudo são boas vibrações. Mesmo jogando no time da "linha branca" e bom conhecedor que me considero da obra que originou o filme, é impossível não perceber a dificuldade que os roteiristas tiveram para transportar a narrativa de Nosso Lar para as salas de cinema.

Com receio de fazer feio ou não corresponder com fidelidade aos princípios esposados pelo livro, a adaptação do texto foi precária, tomando tempo demais nas explanações morais e detalhando muito pouco dos aspectos pseudocientíficos que poderiam explanar melhor para o público leigo as situações a que estão submetidos os espíritos no plano astral. Também é de se notar a contrastante atuação de atores como Renato Prieto e Paulo Goulart com o restante da trupe, que pecou pela teatralidade de gestos e diálogos - um problema muito comum nos filmes nacionais, onde grande parte dos atores vem do palco. Se a intenção era transparecer uma realidade de além-túmulo, porque não agir com a normalidade que se esperaria de seres humanos mais acostumados à uma situação fora do lugar-comum?

A opinião particular deste colunista é a de que o filme poderia ter focado mais nos típicos atributos de um "filme pipoca" e sacrificado um pouco da filosofia espírita, com a finalidade de se produzir algo mais palatável às massas e mais fácil de agradar ao público internacional. Ou seja: não faria mal um pouco mais de ação, closes interessantes e uma leve variação da  musicalidade new-age que integra a obra. Ao contrário do que acreditam certos críticos, não vejo Nosso Lar como o típico filme de proselitismo, pois a impressão que tenho é que o mesmo foi feito de espíritas para espíritas, e para agradar espíritas, tendo assim pouca chance de satisfazer às pessoas menos acostumadas à literatura kardecista.